SAÚDE-PÚBLICA & DESASTRES
- Randal Fonseca
- 14 de jul. de 2024
- 9 min de leitura
As políticas de Saúde Pública e as práticas de Preparação Doméstica para Desastres se unem nas respostas de recuperação em longo prazo e de alto custo.
DESASTRES E DOENÇAS
O planejamento para promover a Saúde Pública inicia com pessoal treinado para rastrear uma miríade de referências que permitam postular o que é necessário à efetiva qualidade de vida da população. No entanto, o JGE chama atenção para a necessidade de as políticas públicas voltadas à Saúde incluírem, da mesma forma, e na mesma medida referências que possibilitem as populações alcançarem níveis desejáveis de qualidade de vida após terem sido atingidas por desastres.
A Saúde Pública precisa inserir nas equações políticas os métodos e técnicas para que as famílias possam recuperar não apenas das lesões físicas e contaminações cruzadas, mas que também possam retornar à normalidade operacional no âmbito doméstico e profissional, após o impacto de desastres.
É neste âmbito que a Gestão de Emergências une esforços com a administração da Saúde e Bem-estar. Vejamos: o rastreamento promovido pela Saúde Pública inclui métodos que possibilitam antecipar os riscos de epidemias e planejar as campanhas de educação pública sanitária e de vacinação, por exemplo.
Já, o rastreamento e antecipação aos desastres não dependem de vacina, mas sim dos métodos de educação pública voltados a mitigação de riscos e de preparação doméstica, que envolvem além da saúde física e mental, cuidados com a preservação das propriedades, dos meios de produção e de seus animais.
COMBINAÇÃO EXPLOSIVA
Os conceitos que subjazem as políticas públicas relativas à promoção da saúde têm postulados simétricos. Assim, da mesma forma, a metodologia adotada para o planejamento doméstico para desastres revela que a simetria das recomendações é igualmente aplicável, tanto ao conjunto de políticas-públicas para Saúde, como para as políticas públicas da Preparação Doméstica para Desastres.
No entanto, na prática, não é isso que se vê. O espectro de ações da promoção da Saúde, indubitavelmente, recebe maior atenção governamental por ser uma herança cultural dos grupos humanos que perceberam a importância de manter a população consciente dos riscos de infecções cruzadas.
Uma possível e desejada política voltada a educação pública para manter o ambiente doméstico em estado natural de prontidão para desastres, deixa um espaço vazio no setor.
Pela forma vigente de administrar os impactos de desastres, o que se vê, é a declaração de “calamidade pública”, que não tem proposta para, pôr antecipação, tratar dos efeitos.
Paulo M. Buss (Ciência & Saúde Coletiva: On-line ISSN 1678-4561) escreveu:
“Saúde é um direito humano fundamental reconhecido por todos os foros mundiais e em todas as sociedades. Como tal, a saúde pública se encontra em pé de igualdade com outros direitos garantidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948: liberdade, alimentação, educação, segurança, nacionalidade etc.”
Sendo a Saúde reconhecida como o maior e o melhor recurso para os desenvolvimentos social, econômico e das dimensões da qualidade de vida, é lícito reiterar que dentre os “outros direitos garantidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos” esteja incluída a preparação doméstica para desastres.
Assim, se a saúde e qualidade de vida são dois temas estreitamente relacionados, segundo concordam e atestam inteiramente os pesquisadores e cientistas sociais, urge reconhecer que o fomento à preparação doméstica para desastres esteja alinhado no mesmo sentido.
A Saúde contribui para melhorar a qualidade de vida e, portanto, todos os indivíduos na comunidade precisam ter saúde para exercerem os seus direitos fundamentais.
Não há como separar a saúde da qualidade de vida, portanto, sem dúvida, há que se adicionar imediatamente os métodos e práticas da Preparação Doméstica para Desastres às políticas de Saúde Pública, como base a equilibrar os sistemas sociais.
TEMA NACIONAL E INTERNACIONAL
Na maioria dos países industrializados, até hoje, a preparação doméstica para desastres não está dentre as políticas-públicas correntes e, portanto, não ingressa efetivamente nos foros mundiais.
Temos visto que o pouco que se faz neste sentido está implícito às atribuições da Defesa Civil, uma vez que pela doutrina vigente, a recuperação de desastres é basicamente um processo reativo. Como tema proativo, Educação Pública para Desastres só entra na pauta ESG quando as autoridades são instadas pela grande mídia a apesentar alguma solução.
No âmbito dos incidentes laborais e desastres ambientais provocados pelas atividades empresariais, compete a gestão de Saúde e Segurança Ocupacional e do Ministério Público Federal ou Estadual de Meio Ambiente tratarem do tema, fundamentando as investigações na adesão às compatibilidades com leis e normas técnicas.
Neste sentido, as imputações das falhas, de maneira geral, são atribuídas a Engenharia de Segurança e, às vezes aos gestores de meio ambiente. Ou seja, o tema “controle de emergências e recuperação de desastre” somente tem prevalência no âmbito das responsabilidades delegadas às organizações de iniciativa privada. Então, considerando que no âmbito doméstico os desastres são de responsabilidade governamental (Defesa Civil) o assunto, estrategicamente fica fora das políticas públicas de Saúde, sob a argumentação de se tratar de episódios imprevisíveis.
No âmbito das organizações, tanto de inciativa privada como governamentais, a “preparação doméstica para desastres” não aparece como item de planejamento estratégico em nenhum dos setores, pois esses episódios transcendem tanto as obrigatoriedades empresariais como governamentais, mesmo que um desastre atinja a residência dos seus líderes ou trabalhadores e que, com isso, impacte o setor produtivo.
O que parece diante do que se vê, é que o argumento da preparação doméstica para desastres seja nada mais que um devaneio da Gestão de Emergências. Não é nada isso.
A disciplina Gestão de Emergências veio preencher esse hiato processual, apontando as falhas ESG para ingresse com a Saúde e Economia voltadas a preparação para desastres.
ANÁLISE ESTRUTURANTE
Analisando o acima exposto, constata-se que a preparação doméstica para responder a desastres, de maneira geral, está fora do escopo das políticas de saúde pública ficando, portanto, a depender de improvisos intuitivos, eivados de atos de heroísmos que nada têm de técnico-científico, como seria de se esperar.
O que se percebe é um planejamento do tipo “organização desorganizada” que resulta da soma de experiências individuais e, a partir daí, conteúdos de lavra própria entram no domínio do conhecimento empírico com pretensa cientificidade; os arremedos vão sendo costurados com algumas técnicas mais elaboradas, às vezes obtidas algures, com avaliação de eficácia balizadas por meio de tentativa e erro: em geral, com mais erros por tentativa.
Para avançar neste processo é necessário interceder com disciplinas estruturantes embasadas em fundamentos com método, rigor e objeto, ou seja, as premissas da ciência.
Na medida em que se enfatizam a necessidade de planejar para responder a desastres com a preparação doméstica incluída nas Políticas Públicas, ocorrem fenômenos gerenciais que arremessam essas ordenanças para níveis duvidosos de especialização. A falha na formação dos atores pervertem o objetivo da efetiva educação pública, em que níveis aprofundados de conhecimento deveriam estar sendo premissa obrigatória das políticas governamentais.
De acordo com Paulo M. Buss, “a promoção da saúde deve privilegiar a melhoria da qualidade de vida, com participação direta no controle do processo de educação”.
Buss adita que “a Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada em Ottawa, no Canadá, em 1986, estabeleceu uma série de princípios éticos e políticos, definindo os campos de ação. Buss reitera que para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social, os indivíduos e famílias devem saber como satisfazer necessidades essenciais e modificar favoravelmente o ambiente natural, político e social”.
O JGE adita que a saúde é um conceito positivo e enfatiza a importância do acesso aos recursos com capacidades físicas e habilidades. Assim, não é pertinente o setor “Saúde” determinar o estilo de vida saudável das populações sem adicionar à equação a educação voltada a preparação doméstica para desastres como fator intrínseco às Políticas Públicas.
Essa composição se encaixaria perfeitamente na exigência para melhorar o capital humano.
A percepção dos processos auxilia fortalecer a resistência a fenômenos climáticos e antropogênicos que subjugam a vida, causam danos ao meio ambiente e provocam perdas patrimoniais em escalas que vão desde logradouros aos meios de produção e subsistência que, podem acometer até em escalas globais, a exemplo do Círculo de Fogo do Pacífico.
Ao comparar os danos à saúde pública causados pelas doenças, como os decorrentes de impactos, é possível perceber a similitude à prevenção voltada à educar indivíduos, famílias e comunidades a assumirem responsabilidades, para que, de forma competente participem nas decisões estratégicas voltadas a um estilo de vida saudável.
Por razões histórico-culturais há notória prevalência em promover políticas-públicas com foco na saúde sanitária, com muitos subsídios que podem incluir conferências locais, nacionais e internacionais voltadas exclusivamente ao tema. Por outro lado, a atenção aos efeitos deletérios dos desastres tem estado relegada unicamente a agências de resposta com atuações circunscritas a localidades, com modos-operandi muito particulares.
Cada agência tem linguagem, hierarquia de comando, treinos e atribuições independentes.
Quando essas agências são chamadas a atuar, há sempre um tempo-resposta que os cidadãos precisam aguardar. Esse intervalo de espera tem sido a diferença entre a vida e a morte, e ainda, muitas vezes, a diferença entre uma recuperação rápida ou impossível das estruturas atingidas, ou em casos mais localizados, relegadas ao descaso para sempre.
Agora pense a respeito se a atenção dispensada à saúde pública percorresse o mesmo rito processual de resposta multiagência, tendo cada uma delas sua própria forma de atuar.
Ou seja, enquanto o monitoramento das condições de saúde da população se dá no âmbito global e integrado, a preparação de indivíduos, famílias e comunidades para desastres é tratada como evento localizado e setorizado por tipo de ocorrência.
NÃO DEVE SER ASSIM
Uma análise sem muita sofisticação logo revela que os desastres quando enfrentados sem a possível e desejada preparação para unir esforços cooperados, causam sérias perturbações a centenas de milhares de vidas todos os anos. Cada desastre tem efeito duradouro, tanto para as pessoas quanto para a propriedade e meio ambiente.
TEMPO-RESPOSTA INTEGRAL
Quando um desastre atinge uma comunidade, o governo local deve prestar ajuda, mas nem sempre isso se dá na proporção e no tempo-resposta em que as populações atingidas acreditam que receberiam das autoridades. As ajudas humanitárias ficam delegadas a ONGs que tentam compensar as lacunas deixadas pelos governantes. Cada setor – governo, ONG e empresas privadas desempenham ações parciais com tempos-resposta diferentes.
Planejar para estar preparado para desastres, até hoje, é o ponto fulcral para as famílias.
NÃO ESPERE, FAÇA.
As respostas a doenças partem de um comando único que integra todas as ações de resposta, e isso é um sistema internacionalmente convencionado. No entanto, os males a saúde, tanto físicos como emocionais, provocados por desastres, não estão contemplados por esses parâmetros. Isso permite concluir que o padrão para resistir e resilir aos efeitos dos impactos de causas naturais ou antropogênicas precisa ser a partir de cada pessoa, de cada família e do conjunto comunitário.
IMPORTÂNCIA DE ESTAR PREPARADO
A razão de se estar preparado é para garantir que as pessoas não fiquem paradas enquanto estão a aguardar ajuda, pois a “ajuda esperada” poderá estar com a atenção voltada a outros objetivos, como aos próprios familiares dos respondentes, ou os recursos podem ter sido gravemente atingidos pelo evento e já não haverá como chegar de imediato, mas as necessidades imediatas podem estar a ameaçar a vida e a propriedade.
Pessoal das ONG e das agências independentes de governo podem estar concentrando esforços em outras localidades e não ter meios de prestar socorro a todos na mesma medida. Por isso, cada pessoa e cada família e comunidade devem se perguntar se estão aptos “preparados” a sobreviver com qualidade a uma intempérie ou a qualquer impacto, como ondas de calor, frio intenso, enchentes ou mesmo terrorismo.
Alcançar a autossuficiência, significa não ficar a estender as mãos a agências, mas estar apto a prover água, alimento, abrigo e primeiros socorros à família e animais de estimação.
EM SÍNTESE
A proposta é implementar uma prática interdisciplinar, coordenada pela Gestão de Emergências, que integre diferentes saberes à promoção da saúde, não somente da forma tradicional, mas com inclusão de competências para lidar em amplo aspecto com os efeitos de desastres que atingem diferentes localidades com peculiaridades singulares.
Os Programas da Saúde da Família, como também aquelas políticas dedicadas à qualificação dos agentes comunitários de Saúde, precisam incorporar os fatores provocados por desastres. Sem a injunção das políticas públicas teremos perenizado as tradicionais formas míopes de enxergar problemas similares, mas que deliberadamente são tratados de formas diferentes.
A SOLUÇÃO ESTÁ NA GESTÃO DE EMERGÊNCIAS COM OS PONTOS:
A preparação doméstica para desastres implica em cada indivíduo estar apto a prover autoajuda e ajudar seus familiares, prevenindo contra agravos que podem incluir ações de gangs, pessoas oportunistas e falhas no tempo-resposta das agências.
Na preparação doméstica para desastres está a formação de adultos para aplicar os primeiros socorros em áreas frágeis e contextos instáveis.
Áreas frágeis são identificadas pelos níveis de Educação e de Recursos.
As áreas frágeis são avaliadas sob a ótica das interconexões com áreas não-frágeis, e da gestão para alcançar objetivos e melhorar a condição dos contextos instáveis.
A Gestão de Emergências é a disciplina a cuidar das especificidades da preparação doméstica para desastres, que inclui tanto os educadores, como os recursos.
No nível avançado (formação de gestores de emergências) há a maior concentração de áreas frágeis e contextos com multiplicidade de recursos mal direcionados, devido ao fato de a Gestão de Emergências ser desconhecida ou mal interpretada.
ACESSE JGE A NOVA GERAÇÃO #1).
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