DESASTRES ATACAM O FUTURO
- Randal Fonseca
- 13 de dez. de 2023
- 4 min de leitura
O QUE É O FUTURO?
Essa é uma pergunta que parece não ter sentido, pois todos nós temos pelo menos uma ideia do que é o futuro. Porém, todos os que tem alguma noção sabem que o futuro não existe. O futuro é uma ideia gerada a partir da capacidade humana de abstrair, de projetar, de pensar para além do que aí está. Mas para pensar é preciso utilizar a linguagem. Quem não conhece a estrutura da linguagem não pode pensar com acuracidade. Então, quando nos referimos aos potenciais destrutivos dos ataques de desastres ao futuro, estamos a exercer a capacidade de projetar um horizonte indesejável e a considerar a natureza de impactos possíveis ou prováveis. Mas atinar sobre danos e sofrimentos é um exercício que não corresponde a “ter bons pensamentos”. Pois é. Sob esta consideração podemos então afirmar que a Ciência das Emergências pensa exatamente sobre aqueles eventos que não podem estar inseridos no conjunto de “bons pensamentos”, mas que estão sob o domínio da prevenção. Esta forma de abstrair é algo para lá de bom, é a excelência do ótimo em preparar as defesas contra aquilo que ainda não sabemos o que poderá ser, mas que teremos que saber antes de acontecer.
Para que se tenha um futuro sem desassossegos é preciso “pensar o impensado”
O termo RESISTÊNCIA expressa a capacidade de se suportar impactos e resistir a algo que, em primeiro lugar, teremos que saber do que se trata. Ao preparar para resisitr estaremos a pensar sobre uma possível peerturbação e imaginar qual será o tipo e a força do ataque ao futuro.
Com base nas projeções consubstanciadas pela linguagem é que a disciplina Gestão de Emergências atua, no sentido de identificar perigos e analisar os riscos para determinar quais as medidas de resistência a diferentes tipos de impactos para não ter que lidar com os danos. Portanto, a resistência depende de experiências que, somadas aos conhecimentos, possibilitam fazer investimentos para se ter os recursos e as habilidades para resistir.
O termo RESILIÊNCIA expressa a capacidade de um sistema retornar ao seu estado original após um distúrbio. Esse termo vem emprestado da Física. A resiliência de materiais e de sistemas é estudada como um fator intrínseco a natureza dos elementos. Neste caso, o nível de resiliência de um insumo é mensurado para ser empregado em compostos com objetivos pré-definidos. Então, para melhorar a resiliência de um aparato é necessário investir e testar.
A Psicologia emprega o termo “resiliência” para referir ao equilíbrio emocional.
Assim como os materiais, cada elemento, e nesse caso cada pessoa, tem sua própria capacidade de resilir. Mas para aumentar essa faculdade, tanto dos materiais como das pessoas, é necessário investir em conhecimento, aportes financeiros, tempo ou para formação de compostos (materiais ou humanos). O que se tem visto é as pessoas empregarem o termo RESILIÊNCIA para substituir a o termo RESIGNAÇÃO. Errado.
O termo RESIGNAÇÃO não é sinônimo de resiliência e nem de resistência. A palavra resignar explica a condição em que o futuro pertence aos desígnios; a algo que está escrito nas estrelas, àquilo que nada se pode fazer para mudar, muito menos resistir, e tampouco resilir. Ou seja, presume-se que por ser um propósito divinal temos então que nos curvar e considerar os ataques ao futuro como algo excelso, pois decorrem das melhores intenções metafísicas cuja intensão é de nos ensinar. Se é assim, cumpre-nos aprender sem contestar ou impedir, mas aceitar (resignar).
✓ A linguagem reflete a capacidade de se estar apto a fazer projeções dos impactos advir. ✓ A resignação reflete a incapacidade de pensar impactos advir e dos danos decorrentes.
✓ A Gestão de Emergências lida com tradições que dificultam adequar a linguagem.
✓ O uso imperfeito da linguagem contribui com os desastres que atacam o futuro.
O MUNDO DA LINGUAGEM E O MUNDO REAL
Para o filósofo Ludwig Wittgenstein conectar palavras com o mundo real só seria possível se existisse uma correlação entre o mundo, o pensamento e a linguagem. Ou seja, se houvesse uma correspondência entre a figuração do mundo na linguagem e o próprio mundo afigurado. Wittgenstein explicou que "na figuração e no afigurado deve haver algo de idêntico, a fim de que um possa ser, de modo geral, uma figuração do outro".
COMO É POSSÍVEL PROVAR QUE PENSAMENTO, LINGUAGEM E MUNDO TÊM A MESMA FORMA LÓGICA?
O filósofo concluiu que “isso não pode ser demonstrado: é algo que apenas se mostra e, para demonstrar aquilo que se mostra através da linguagem e do mundo é preciso uma teoria a referir a totalidade do mundo e da linguagem”, e acrescentou: “isso é impossível, pois quando falamos sobre o mundo já estamos dentro da forma lógica e não há como vê-la de fora”.
ESTAMOS HOJE A SABER DAQUILO QUE NINGUÉM SABIA E AGORA SOMOS RESPONSÁVEIS POR ESSE SABER.
Bem-vindos ao século 21, um tempo em que além de atribuirmos valor àquilo que se enxerga, também estamos a pôr preços naquilo que não existe, mas que sabemos poder atacar. Desastres atacam o futuro, mas sabemos prever e, sem resignar, podemos resistir e resilir.
A resignação não custa nada no presente, se comparada aos custos da resistência e resiliência, mas estamos a testemunhar o termo resiliência a substituir o termo resignação. Isso não é um engano inocente ou um deslize linguístico, mas uma enganação que custará muito mais, porque os desastres são imperiosos e, ao atacar causam sofrimentos e danos nada resignáveis.
As palavras expressam o mundo fora do mundo, de onde os desastres atacam o futuro.
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