top of page

INCÊNDIO FLORESTAL OU QUEIMADA QUE SAIU DE CONTROLE? *

  • Foto do escritor: Jornal da Gestão de Emergências
    Jornal da Gestão de Emergências
  • 2 de fev. de 2024
  • 6 min de leitura

ree

Para se responder é preciso se ter um consenso sobre o campo de estudo e o significado dos desastres.



Pelo que consta, atear fogo nas pastagens é uma técnica herdada dos povos originais por diferentes tipos de agricultores que, por suposição, deveriam ter da mesma forma aprendido a controlar as chamas e por isso recebem a designação de “queimada “e não de incêndio. No entanto, o aspecto semântico, como colocado na questão, é que esse fogo está relacionado a heranças culturais esmaecidas, que em outras palavras significa “conhecimento esmaecido da técnica para controlar as chamas”.


Ano após anos essa contumaz “perda do controle” impacta e, todas as vezes as explicações são iguais ou parecidas, possibilitando concluir que essa praxe está relacionada a mais do que uma falha operacional por esmaecimento cognitivo. Sob esse ponto de vista voltamos à premissa de ser necessário aprofundar o campo de estudo e buscar o significado dos desastres.


Desastres antropogênicos, como as queimadas, e seus efeitos socioeconômicos estão sob a lupa da mídia internacional que exalta a culpa dos produtores rurais que protagonizam as tais “queimadas controladas” sem que tenham a habilidade e recursos para efetivamente controlá-las. É possível afirmar que há nestes episódios uma falha recalcitrante e ao mesmo tempo graves suspeitas sobre a razão que subjaz ao fenômeno. Ao alegar ser a perda de controle das chamas resultado da falta de recursos, fica caracterizado existir uma diferença substancial da teoria com a prática. Vejamos: as queimadas têm origem nas práticas indígenas – que não reclamavam de falta de recursos.


Com isso a designação semântica de queimada tem sido referida como um jargão que não coaduna com o fato. A verdade, o fato, é que os fogos florestais seguem ocorrendo e a definição do evento está recebendo a designação de “perda de controle”, para definir situações diferentes. Ou seja, o termo queimada, em vez de fogo criminoso, continua sendo empregado e mantido para explicar eventos díspares. No processo da avaliação de risco, encontraremos uma ampla gama de pontos de vista, e com isso, se possibilita atribuir designações que não expressam exatamente o que se está vendo, concluindo por conseguinte ser um “desastre” e se omitindo o complemento “criminoso”. Com isso, sob a ótica epistemológica, as enfáticas justificativas suscitam observar o problema sob diferentes teorias. Ora, se os responsáveis por atear fogo para produzir a “queimada controlada” alegam terem sido vítimas, e não causadores, simplesmente por não terem conseguido obter recurso adicional, mesmo após terem solicitado, e essa justificativa ser a mesma apresentada em anos anteriores, não se pode classificar o evento como desastre. O que é um desastre? Qual é o significado de desastre?


VAMOS ANALISAR O CONTEXTO

Em primeiro lugar, para atear fogo com objetivo de fazer “queimada controlada”, o dito agricultor protagonista do evento deve garantir os meios para efetivamente controlar a condição. Se a calhar o fogo se espalhar para além de seu nível de controle, o responsável também tem que ter certeza sobre obter auxílio externo com recursos adicionais para apagar o incêndio que, de forma “emergente”, se originou da sua queimada. Mas, na realidade, ano após ano, esse recurso adicional externo não existe – isso dito pelas próprias autoridades governamentais das regiões onde essas queimadas tradicionais provocam recorrentes florestais calamitosos. Uma análise sem muita profundidade revela no mínimo falha ou erro de planejamento, ou má-fé. Ambas as premissas são condições passíveis de punição. Ora, se os praticantes de queimadas reiteradamente perdem o controle dos limites e de antemão já sabem que não podem contar com recursos adicionais, de forma alguma, então a prática de promover queimadas precisa ser interrompida e criminalizada, pois os piromaníacos reiteradamente lançam a culpa nos órgãos de governo por suas deliberadas ações irresponsáveis (criminosas) de gerar incêndios florestais.

ree

Não há como desculpar, mas há sim que se culpar os incendiários que se escondem por detrás da suposta herança cultural de gerir plantios e pastagens. Não é mais nada disso.


Em segundo lugar ainda temos que responder qual é o significado dos desastres, pois essa questão está essencialmente alinhada a aspectos semânticos, que analisaremos adiante. Mas para iniciar, e em vez de responder, vamos adicionar mais perguntas para refletir:


A) O que é gestão de emergências?


B) O que é gestão de desastres?


Em parte, a interpretação dessas arguições depende de conceitos para que os eruditos se apropriem desses conjuntos de saberes. Com isso, adicionaremos ainda mais diversidades ao significado desses conjuntos epistemológicos afetos a Ciência das Emergências; um ramo da Sociologia. A sociologia dos desastres está irrefutavelmente enlaçada à sociologia ambiental.


A disciplina Gestão de Emergências entra no âmbito das ações práticas para selecionar os métodos de interpretar as diferentes formas de eventos socialmente perturbadores e suas origens econômicas. Por isso essa disciplina foi incorporada ao quadro geral da Gestão de Desastres. Assim, a “Gestão de Emergências” de forma abrangente e antecipada, deixa de estar circunscrita a tradicional interpretação de “operações em emergências”, ou seja àquelas ações de intervenções – para integrar o contexto das atividades econômicas e sociais – aspecto impensável há menos de uma década. O fator-chave para esta nova forma de pensar é a união do componente "gestão" com a unidade de pensamento "emergência". Essa percepção semântica ampliou o foco elevando a visão para um tipo específico de gestão, em que os episódios são examinados sob uma perspectiva holística, dirigindo a atenção para as ações precursoras: o planejamento estratégico, com atividades continuadas de mitigação e de preparação, com vista a integração de recursos para resposta e recuperação, como um conceito central da “coordenação de esforços cooperados”.


Uma vez que essas premissas estejam introjetadas e colocas em foco, o próximo estágio será a “gestão de desastres” que reflete as estruturas socioeconômicas a operar dentro de cada segmento social, alinhado às “culturas” encontradas nos contextos frágeis:

por exemplo: “as queimadas ao saírem controle não são incêndio."


A formação de gestores de emergências reflete requisitos iminentes em vários aspectos da sociedade e, portanto é de se esperar que neste nível ocorra também uma mistura de variabilidade e semelhanças. Há muito o que ser adquirido e desenvolvido para se chegar a dominar por completo tal entrelaçamento, particularmente se ao fazê-lo se pretender alcançar um maior entendimento sobre como compartilhar contextos (frágeis e estáveis), buscando saídas semelhantes, mesmo se os requisitos de resultados forem diferentes. Por exemplo, alguns sistemas descritos como gestão de emergências são, na visão do século 20, exclusivamente “ambulâncias e sirenes”, enquanto outros são “grupos voluntários de ONG a atuarem como bombeiros sapadores" – buscando serem heróis na intervenção. Essas estruturas de pensamento conduzem a debates em que os princípios deverão ser postulados para que se chegue a conceitos e se estabeleçam os consensos – nada é simples, é complexo.


ENTÃO VAMOS LÁ


Para desenvolvermos os meios de coordenar a cooperação e explorar uma série de temas considerados de importância, como por exemplo, os elementos da tecnologia da informação com inteligência artificial e da conectividade por meio da Internet de todas as Coisas; as telecomunicações com interoperabilidade para se chegar à verdade, será necessário realizar um conjunto de ações de formação específicas para abrir as oportunidades profissionais. Uma nova era de atividades especializadas deve começar para se chegar à Gestão de Desastres, a partir da Gestão de Emergências, que modifique a condição de fragilidade dos contextos, reduzindo com isso os efeitos das especulações oportunistas. No entanto, como em tudo, o tempo é um elemento crítico e o que importa neste sentido é dar início ao processo.


COMEÇAR JÁ


A gestão para emergências como disciplina inovadora tem a finalidade de, em primeira mão, conscientizar os responsáveis das organizações públicas e de iniciativa privada sobre a importância de desenvolver meios para promover a Educação Pública para Desastres. Esse tipo de “Educação” tem a ver com indivíduos, famílias e comunidades, para que todos mantenham estado natural de prontidão e, com isso, reduzam as vulnerabilidades aos riscos, apliquem medidas de mitigação e preparem para responder a eventos indesejáveis, planejando como recuperar de impactos em tempo-resposta e custos conhecidos.


Em terceiro lugar, vamos nos debruçar sobre a linguagem própria para expressar o âmbito das ações e dos recursos necessários para controlar emergências e desastres. Por exemplo, o termo “recurso”, na gestão de emergências, indica “pessoal qualificado com equipamentos adequados” aos objetivos da resposta. O termo “emergência”, neste âmbito da gestão indica que eventos orgânicos, afetos às atividades da rotina operacional, são aqueles que podem ser controlados apenas com os “recursos próprios” da organização social de inciativa privada. O termo “desastre” expressa uma condição mais ampla, em que os grupos sociais para controlar um episódio surpreendente dependerão de obter recursos adicionais, fornecidos por agências governamentais e não-governamentais para controlar a condição.


Tanto para controlar emergências como desastres é preciso dimensionar, por antecipação e de forma abrangente, a magnitude potencial dos eventos e a partir daí projetar se há recursos próprios suficientes ou se será necessário obter recurso adicional, se a calhar a condição expandir caracterizando o desastre. Essa mensuração hipotética depende de se empregar métodos de avaliação com flexibilidade e cientificidade para, inclusive, analisar os fatores que influenciarão na velocidade de expansão das ameaças e tempo-resposta durante o processo de controle. Desta forma, os recursos adicionais devem ser identificados antes, muito antes de a condição sair da categoria “emergência” para responder qual o significado de “desastre”.


Comentários


bottom of page