GRATIFICAÇÃO NA SEGURANÇA *
- Jornal da Gestão de Emergências
- 2 de fev. de 2024
- 6 min de leitura
A BUSCA PELA CONSCIÊNCIA E A GRATIFICAÇÃO NA SEGURANÇA
O conceito “segurança” é bastante abrangente nas sociedades complexas onde é adotado para expressar uma miríade de nuances situacionais. Afinal, sabemos que independentemente e a despeito de todos os artifícios que possamos empregar, eventos inesperados impactam, desafiando as técnicas e métodos que desenvolvemos e aplicamos para estarmos seguros.

A CONSCIÊNCIA E AS ILUSÕES
Ao tomarmos consciência de que não há aquela “segurança” inexpugnável que gostaríamos de obter, ainda assim quase que como uma ilusão buscamos estar seguros, pois será melhor isso do que baixarmos as defesas. Ao se assumir que a segurança é, portanto um estado dinâmico em que fatores aleatórios insistem em criar e recriar ameaças, temos em contrapartida que estar a cada instante a nos antecipar e a exercitar a antevisão, associando um escudo de proteção contra o que conhecemos e, como um paradoxo, até para o que desconhecemos. A segurança depende, pois de critérios que ao serem mantidos com sucesso não provoque o esmorecimento. Para isso, para se manter alerta é necessário ativar diferentes formas de estímulos, como variar as perspectivas, mudar de posição, buscar melhor amplitude de visão, aguçar os pontos de vista, sensibilizar a audição, as captações vibracionais e as sombras em um aspecto mais enigmático. Todas essas estratégias somadas ainda deixam vulnerabilidades por onde fatores subjetivos relacionados às culturas se esgueiram, passam e impactam. Nas empresas, o conceito de Segurança Laboral é imperativo, há inclusive o sentido de aplicar punições para as eventuais falhas em seguir procedimentos operacionais. No contexto geral, cumpre a Engenharia de Segurança desenvolver sistemas mais seguros, aprimorar desenhos de máquinas, ferramentas, ambientes, práticas e fórmulas para a proteção dos trabalhadores.
Todo o aparato percepcional precisa estar amparado pelo fator educação, treino e supervisão. Embora um técnico da segurança busque ajudar os trabalhadores a se manterem seguros, incidentes laborais seguem a ocorrer principalmente nos países industrializados.

Há que se observar os detalhes. É no detalhe e nas subjetividades que a percepção deve aprofundar as análises, e isso é verdade tanto no ambiente de trabalho como no trânsito.
TECNOLOGIAS DE MONITORAMENTO
Cada vez mais testemunhamos os avanços nos sistemas inteligentes de monitoramento do trânsito. Assim, mesmo sob os cuidados de guardas de trânsito nas blitzen, como por meio das câmeras de vigilância muitos condutores transgredem, matam ou perdem a saúde ou a própria vida por negligenciar o conceito “segurança”. Então motoristas e trabalhadores têm algo em comum, evidenciando ser a atitude insegura uma verdade nas ruas, nas avenidas e estradas, no local de trabalho e no ambiente doméstico. As falhas e as estatísticas nos levam a poder afirmar que mesmo com todo o cuidado que pressupomos orientar trabalhadores e condutores é possível afirmar que incidentes ocorrem a revelia e a despeito de toda a segurança. Há, pois ser necessário revisar à exaustão todo o arcabouço de defesa e proteção.

Reexames dos sistemas e das teses de suporte às pressuposições de eficiência
REAVALIAÇÃO DAS POSIÇÕES
Quando um Técnico de Segurança supervisiona os trabalhadores, esse profissional dedicado não é tido como um aliado, mas sim como um algoz a apontar falhas, erros e inconformidades nas operações. Nessa condição ele é um inoportuno e, como resultado, os demais trabalhadores se unem em um espírito de corporativismo, da mesma forma como ocorre nas vias e rodovias quando há uma blitz policial. Os condutores assumem policiais como algozes.

Os condutores piscam faróis para avisar os veículos trafegando no sentido contrário de que há (blitz) inspeção policial adiante.
Embora a função dos guardas de trânsito na blitz, como a dos técnicos de segurança no trabalho, em tese, tenha a melhor das intenções, surge um sentimento de dúvida por parte dos supervisionados quanto a verdadeira intenção desses “guardiões da segurança”. Mas por que há essa dúvida? De onde vem esse ceticismo que contamina a confiança dos que estão sob esses acolhimentos zelosos das instituições? Pode ser porque os polícias nas estradas tenham apenas a intenção de alcançar metas de multas estipuladas por uma política arrecadatória. Mas isso existe? Pode ser verdade? Da mesma forma podemos questionar se o técnico de segurança do trabalho está buscando demonstrar eficiência com vista a ser premiado na SIPAT anual. De onde surgem essas presunções canhestras? Será que isso já ocorreu? Será que em alguma localidade já foram estabelecidas metas de multas por políticas pecuniárias. Será que as lideranças empresariais premiam na SIPAT os técnicos que mais apontaram as atitudes inseguras dos trabalhadores? Como aferir essas suposições para se ter certeza das intenções?
UMA COISA É REAL
O espírito corporativista tem imensa probabilidade de se formar quando um grupo de pessoas se identifica pela similaridade de percalços impostos por outro grupo ou indivíduo com algum poder outorgado. Nos países em que as regras não ficam bem esclarecidas, há, portanto razão para que se desconfie do indivíduo investido de alguma autoridade. Esse é um aspecto cultural emblemático que coloca as leis, regras, normas e às vezes até a própra constituição encobertas com tons de cinza. Quando por outro lado as regras são claras, preto no branco, sem nuances interpretativas, devidamente estabelecidas e bem definidas não há, portanto razão para se ter dúvida do que pode estar certo ou errado, ou realizado de forma inconveniente.
Mas a dúvida subverte o respeito pela autoridade e, com isso a dissimulação se instala.
O MEDO ABRE CAMINHO PARA O CINISMO
Para prevenir o desgaste institucional das superintendências é necessário que os trabalhadores, como também os condutores, tenham certeza da boa intenção daqueles que estão investidos do poder de monitoração e, acima de tudo, é preciso que os monitorados desenvolvam a confiança a ponto de admirar e respeitar os supervisores, em vez de os temer. Mas há consenso entre os pragmáticos no sentido de que é bem mais fácil e mais simples impor o temor do que ser admirado e respeitado. Então, é preciso definir como e quem promoverá o incentivo para os indivíduos encontrarem a motivação e desenvolverem a consciência que os levará a assumirem uma conduta segura, livre de ceticismo. É necessário inspirar trabalhadores e condutores, para que percebam os ganhos da atitude segura, uma vez que essa postura produz as bases para a virtuosidade, livre de dúvidas, e melhor, do cinismo.
COMO AFERIR AS SUBJETIVIDADES

Interpretar subjetividades é uma arte, pois depende de se enxergar o invisível
No ambiente de trabalho, como no trânsito, as regras explicitadas isso não bastam. As atribuições do pessoal de segurança consistem em obter resultados a partir de ações que não ficam sustentadas por algum objetivo concreto, como se dá com um mecânico que precisa trocar uma peça do motor ou um eletricista que precisa completar uma conexão.
Tanto no local de trabalho como na estrada, as tarefas de supervisionar condutas seguras são fundamentadas em aspectos essencialmente subjetivos, como a de apontar falhas no senso de precaução e de responsabilidade em relação à vida e saúde. Podemos com isso perceber estarmos no mundo das possibilidades e probabilidades onde nada há de concreto ou objetivo, mas só de subjetividades interpretativas, tanto de um lado como do outro. Para que de um lado essas subjetividades se transformem em consciência de segurança, como regra geral, se aplica o método persuasivo que incluem aulas, palestras, depoimentos e treinos onde se exibem vídeos e fotos para convencer os discentes que esses são recursos bem mais amigáveis e confiáveis do que ser multado, ter documento apreendido dentre outras punições.
No entanto, por mais que se invistam tempo e dedicação de formadores, palestrantes e depoentes, ainda assim existirá um imenso potencial de os egressos cometerem falhas, como ocorre em uma luta, como se fosse um jogo, um campeonato, um certame. Vamos tomar como exemplo um jogo de futebol em que há lá um juiz a apitar para apontar os erros e marcar as faltas, podendo, devido a gravidade, expulsar de campo o jogador.
As causas que suscitam penalidades no jogo de futebol são bem conhecidas dos atletas e da torcida. Então, essas penalidades podem ser evitadas desde que as equipes atuem com “Fairplay” – ou jogo-limpo. Por exemplo, os espanhóis investiram nesse tipo de atuação respeitosa aplicando esforços para desenvolver a conscientização dos jogadores e, esse modelo “literalmente esportivo”, vem sendo seguido por outros times europeus. Os sul-americanos, por outro lado, seguem a optar pelo modelo de “jogo-duro”, fazendo entradas e divididas que provocam ferimentos no adversário requerendo do juiz da partida um intenso estado de alerta para manter a disciplina. Por que então devemos acreditar que os trabalhadores e condutores sul-americanos não sejam os mesmos que aceitam a prática da transgressão de regras em ambos os lados do gramado? A resposta pode ser encontrada em um aspecto cultural (subjetivo) e, como tal aceita e convive bem com as práticas inseguras.
A AUTOMAÇÃO PODE AJUDAR

O árbitro de vídeo auxilia a avaliar lances polêmicos nos esportes, como também possibilita corrigir erros na interpretação das subjetividades
Quando um trabalhador é vítima de incidente no local de trabalho, ou quando um condutor provoca ou é vítima de um incidente de trânsito, é feita uma investigação para se entender o que aconteceu e melhorar as regras ou criar novas, ou aumentar os níveis da vigilância para punir os infratores para desestimulá-los a repetir a desobediências às regras e leis e, com isso prevenir que aquele tipo de evento indesejável volte a ocorrer. Mas podemos ver que o jogo-duro, com toda a severidade do juiz segue sendo praticado em campo. Um desafio da cultura.
Quando se busca garantir a segurança e não se consegue alcançar os resultados almejados, é muito provável que ocorra o desânimo de se continuar tentando. A partir daí, quando isso ocorre, será muito provável que um lapso mínimo, por mais sutil que seja, no trabalho ou na estrada, resulte em em tragédia. Com ajuda da tecnologia esses eventos podem ser evitados.
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